(o
postal do Veríssimo)
Prometi mostrar, aqui atrasado, quando falámos do António Carlos, o verso de um postal que Veríssimo José Baptista enviou em 24 de Março
de 1907 a Malhoa. Na altura mostrei a frente, porque reproduz precisamente a Cabeça
do António Carlos, 1903, ou Cabeça de Velho (ou também chamado O
Regedor), já então na colecção de J. Relvas.
Hoje é um bom dia para cumprir a promessa e revelar o resto.
Porque hoje é Dia do “Coiso”.
O postal, dirigido ao «Exmº Snr José
Malhôa», então morador
na «Avenida
Antº Maria d’Avelar», é
simples e conciso:
«O coiso – nasceu 1525 + 1579 [1] foi ferido [mostra o desenho de um olho] direito em 1545 ou 1547 era soldado raso
ferido n’uma escaramuça em Ceuta | Tomada Ceuta 1415 | Servirá?
– | Veríssimo | 24-3-907».
Como facilmente se percebe, esta é uma missiva que apenas se
manda aos Amigos, e aos mais íntimos. Daquelas onde não é preciso dizer grande
coisa que já sabemos que o outro entende o resto. É das que eu gosto.
O Veríssimo era, talvez mesmo a par do Manuel Henrique Pinto, dos maiores amigos de Malhoa. Colegas na Academia - e aqui está ele nesta fotografia que será
anterior à formação do Grupo do Leão - ficaram amigos para a vida. Veríssimo
abandonou cedo os pincéis, terá arranjado emprego estável na Companhia dos
Caminhos de Ferro, quando casa em 21 Out. 1878, o prior dá-o como «ajudante d'engenheiro». Mas, mais de uma vez em ocasiões diversas, Malhoa lamentará o
facto, referindo-se sempre a ele como um condiscípulo promissor. Depois os contactos passariam
a ser esparsos - não era preciso mais, a forte amizade era tudo.
Em 1910, Malhoa pintar-lhe-á o Retrato. Um grande retrato, o
último da série em que retrata os amigos mais chegados em poses e trajos à
le dix-septième siècle. Um retrato que, em 1911, leva mesmo ao Salon
de Paris.
(Mas isto é uma outra história, e fica para uma outra vez…)
Aqui neste postal, como bem se entenderá, Veríssimo responde a um
pedido de ajuda de Malhoa, então às voltas com a investigação histórica sobre a
figura do “Coiso”.
Andava, por essa altura, Malhoa muito atarefado com as encomendas
para o Museu Militar. E a recolha de toda a informação possível para uma justa
feitura das obras era coisa que ambos haviam aprendido nas aulas de Pintura
Histórica. Nessa busca, Malhoa também deverá ter tido notícia de um outro documento,
datado de 1550, que diz o seguinte: « …filho de
Simão Vaz e Ana de Sá, moradores em Lisboa, na Mouraria; escudeiro, de 25 anos,
barbirruivo, trouxe por fiador a seu pai; vai na nau de S. Pedro dos
Burgaleses... entre os homens de armas» [2].
E foi assim, pelas graças do “olho” do Veríssimo e do tal
documento que o diz «barbirruivo» que o “Coiso” de Malhoa terá ganho muitas das
suas acertadas características.
Aqui fica ele,
Camões, 1907,
o sublime,
o grande poeta
Luís Vaz de Camões.
Pela mão de Malhoa,
na versão final
na versão final
existente
no Museu Militar,
e num estudo
a carvão do acervo
do Museu José Malhoa.
Mas também
na sua Poesia,
umas belas
pinceladas
pinceladas
na nossa Língua.
Termino
como Veríssimo:
- «Servirá?»
Termino
como Veríssimo:
- «Servirá?»
Perdigão
perdeu a pena
Não
há mal que lhe não venha.
Perdigão
que o pensamento
Subiu
a um alto lugar,
Perde
a pena do voar,
Ganha
a pena do tormento.
Não
tem no ar nem no vento
Asas
com que se sustenha:
Não
há mal que lhe não venha.
Quis
voar a ua alta torre,
Mas
achou-se desasado;
E
vendo-se depenado,
De
puro penado morre.
Se
a queixumes se socorre,
Lança
no fogo mais lenha:
Não
há mal que lhe não venha.
(Luís de Camões)
(Luís de Camões)
10 Jun. 2016. LBG
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[1]. Hoje em dia ainda não há certeza quanto às datas quer do
nascimento quer da morte do Poeta. As opiniões variam: 1524 ou 1525, e 1579 ou
1580.
[2]. A parte da nau parece que não chegou a ser, pelo menos daquela
vez… terá ido noutra, para a Índia, bem entendido.
[sn]. Actualizados alguns dados biográficos sobre Veríssimo José Baptista em 9 Jun. 2024
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